Trava de R$ 15 bi é suficiente para o governo se aproximar da meta fiscal? Economistas respondem

Haddad anuncia congelamento de gastos para reduzir déficit fiscal este ano após reunião com Lula

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Arrecadação da Paraíba - Reg. 050-21 Dinheiro. Detalhe de moedas de Real. 2021/10/86 Foto: Marcos Santos/USP Imagens

A equipe econômica do governo convenceu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva da necessidade de segurar despesas neste ano para atingir a meta de déficit zero nas contas públicas.

Após uma reunião no Palácio do Planalto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou ontem que o governo f para cumprir as regras fiscais deste ano em meio à frustração com receitas e ao aumento acima do esperado de despesas obrigatórias, especialmente previdenciárias.

Num dia tenso, com alta do dólar, logo após o anúncio dos cortes, a cotação da moeda americana frente ao real passou a cair, já que os valores estavam próximos do esperado pelo mercado.

Haddad informou que o governo fará um bloqueio de R$ 11,2 bilhões devido a estimativas de gastos que superam o limite determinado pelo arcabouço fiscal e R$ 3,8 bilhões em contingenciamento em função de arrecadação insuficiente para alcançar a meta.

Haddad não disse qual será a nova estimativa de déficit nas contas públicas para 2024, mas afirmou que deve ficar próximo do intervalo de tolerância, que permite rombo de até R$ 28,8 bilhões (0,25% do PIB). Em relatório divulgado em maio, a projeção era negativa em R$ 14,5 bilhões:

— Vamos ter que fazer uma contenção de R$ 15 bilhões para manter o ritmo do cumprimento do arcabouço até o final do ano.

Mas será suficiente?

A questão que deve movimentar hoje o mercado é se o congelamento é suficiente para resgatar a credibilidade da política fiscal do governo.

Nas contas de Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da gestora ARX Investimentos, o congelamento de R$ 15 bilhões no Orçamento é insuficiente para atingir até mesmo a banda inferior da meta para o resultado primário prevista no arcabouço fiscal para este ano, que é de um saldo zero entre receitas e despesas, com margem de 0,25 ponto percentual do PIB, para mais ou para menos.

O economista da ARX estima que seria necessário um congelamento bem maior, de R$ 50 bilhões, para o governo atingir o centro da meta de déficit primário zero neste ano.

O economista alertou que ainda será preciso ver o detalhamento do congelamento, previsto para ser publicado na próxima segunda-feira, mas disse que o anúncio do ministro Haddad sugere uma continuidade na aposta de buscar mais receitas.

Conforme Barros, é possível inferir isso pelo fato de que o valor de bloqueios ficou acima do de contingenciamento. É possível que o governo mantenha no Orçamento a elevada previsão de receitas extraordinárias, como acordos em disputas tributárias com grandes companhias – que, até agora, não renderam frutos.

Ainda assim, o economista acredita que os investidores reagirão de forma “neutra a positiva” à medida, evitando novas rodadas de altas expressivas no dólar e nas taxas de juros. Havia entre analistas e investidores a percepção de que o congelamento pudesse ficar em torno de R$ 10 bilhões. Um valor próximo ou abaixo disso poderia levar a novas disparadas no dólar e nos juros futuros, disse Barros:

—Se o governo entrega uma medida com mais materialidade, conseguiríamos ver uma curva de juros (as taxas dos contratos futuros de diferentes prazos) mais baixa e uma taxa de câmbio mais apreciada (com o dólar mais barato).

Suficiente “por enquanto”

Enquanto no bloqueio, o governo pode escolher quais programas serão cortados, no contingenciamento, a redução é linear. Ambos podem ser revertidos no próximo relatório caso as estimativas da equipe econômica melhorem.

Para o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal, Marcus Pestana, o congelamento de R$ 15 bilhões é “suficiente” por enquanto, dado que ainda faltam meses para terminar o ano e poderão ocorrer eventos tanto no lado das despesas quanto das receitas:

— Como passo intermediário é suficiente.

Segundo Pestana, nas contas dos técnicos da IFI, o resultado primário das contas públicas (o saldo entre as receitas e as despesas, sem levar em conta os gastos com juros) deverá fechar 2024 com um déficit efetivo de 0,7% do PIB. Descontados os gastos com a emergência das enchentes no Rio Grande do Sul, o rombo cairia para 0,5% do PIB.

— Pode haver eventos positivos que tornem desnecessário (congelamento maior). Neste momento, é uma sinalização positiva. Entregou 50% que a IFI acha que é necessário.

Um relatório divulgado na última segunda-feira pela equipe de economistas do BTG Pactual, chefiada por Mansueto Almeida, que foi secretário do Tesouro nos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro, colocava o valor de R$ 15 bilhões como uma referência para os humores do mercado em torno do congelamento do Orçamento deste ano.

“A sensação dos traders e analistas de mercado é que uma nova rodada de melhora dos ativos locais vai depender de medidas concretas de contenção de despesas. Assim, há uma grande expectativa em relação ao tamanho do bloqueio do orçamento federal deste ano que será anunciado no dia 22 de julho. Um bloqueio muito inferior a R$ 15 bilhões poderá ser interpretado por analistas como um valor aquém do necessário para dar uma mensagem clara por parte do governo federal do seu real compromisso com as metas fiscais”, diz o relatório.

Medida foi antecipada por Haddad

A decisão foi tomada na chamada Junta de Execução Orçamentária (JEO), que reuniu Lula, Haddad, e os ministros da Casa Civil, ; do Planejamento, ; e da Gestão, . O encontro foi para discutir os detalhes do 3º Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas, que será divulgado na segunda-feira.

Para evitar especulações, segundo ele, o governo decidiu antecipar a divulgação do número principal do relatório.

— Essas informações seriam prestadas no dia 22, estamos antecipando justamente para evitar especulações — disse Haddad.

O ministro disse que serão R$ 11,2 bilhões de bloqueio, em virtude de gastos acima do limite de crescimento real das despesas de 2,5%; e de R$ 3,8 bilhões de contingenciamento em virtude da receita. Isso se dará principalmente, segundo ele, em função de o projeto que permite a compensação da desoneração da folha de pagamento dos setores que mais empregam no país e de pequenos municípios ainda não ter sido votado.

Haddad afirmou que levou números da área econômica para cumprir a determinação de Lula de observar as regras do arcabouço fiscal. Ele explicou ainda que o bloqueio e o congelamento não consideram o pente-fino em programas sociais.

No início do mês, o ministro antecipou que Lula de 2025. Esse número segue valendo e será detalhado em agosto. O que Haddad anunciou agora foi o congelamento de recursos para cumprir a meta em 2024.

— Não colocamos neste relatório uma eventual queda de despesa. Por isso que deu os R$ 11,2 bilhões de bloqueio. Neste relatório, não estamos considerando esse trabalho.

— Ele já foi convencido lá atrás. Hoje (ontem) foi fácil.

Há uma diferença técnica entre bloqueio e contingenciamento. O primeiro ocorre quando há um crescimento de despesas obrigatórias, como a Previdência, e é preciso controlar gastos não obrigatórios — isso é necessário para não estourar o limite de despesas previsto no arcabouço fiscal.

O contingenciamento acontece quando há frustração de receitas e é necessário segurar gastos para cumprir a meta.

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