Brasileiro troca o ônibus pelo carro e pelos apps de transporte, diz pesquisa

Levantamento da CNT indica que participação de ônibus como meio mais utilizado caiu 14 pontos em dez anos

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O uso de transporte público no país perdeu espaço para a locomoção com veículo próprio ou por aplicativos, mostra a Pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana 2024, realizada pela Confederação Nacional de Transportes (CNT) com o apoio da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). Os resultados revelam um “abandono” do transporte coletivo e uma preferência pelas viagens intermediadas por empresas como Uber e 99 em todas as classes sociais.

A pesquisa buscou retratar a realidade dos municípios com população acima de 100 mil habitantes, por meio de entrevistas com os responsáveis de 3.117 domicílios pelo país. Os dados foram coletados entre 18 de abril e 11 de maio deste ano. Os resultados foram comparados com o levantamento anterior, de 2017.

O ônibus ainda é o meio de transporte mais utilizado pelos brasileiros para os deslocamentos nas cidades, com 30,9% das respostas, mas é acompanhado de perto pelo carro próprio (29,6%). Em 2017, a participação dos ônibus nos deslocamentos era de 45,2%, uma queda de 14,3 pontos percentuais — já a fatia referente ao carro era de 22,2%, alta de 7,4 pontos. O uso da moto própria dobrou, passando de 5,1% para 10,9%.

Além da preferência pelo veículo próprio, “pegar um Uber” também se popularizou. A utilização de serviços de transporte por aplicativo saltou de 1% em 2017 para 11,1% em 2024. Já a realização de deslocamentos a pé ficou estável (21,6%), assim como o uso de metrô (4,2%).

O resultado indica que houve uma migração significativa de viagens via transporte coletivo para alternativas individuais, que atualmente representam 68,3% dos deslocamentos, contra 50,2% em 2017.

Abandono do ônibus

Os dados revelam ainda que 29,4% dos participantes pararam totalmente de usar o ônibus para se locomover nos últimos anos, enquanto 27,5% dos entrevistados afirmaram que diminuíram a utilização. Embora o carro próprio ainda seja o substituto favorito (com 38,5% das respostas), a migração de demanda para os serviços por aplicativos foi muito significativa.

Em 2017, eram escolhidos por 2,1% dos usuários que abandonaram os ônibus, contra 18,2% atualmente. A preferência por percorrer o caminho andando, por sua vez, caiu quase 10 pontos, para 19,3%.

Os participantes relataram que a troca do ônibus por outro meio de transporte foi motivada pelo baixo conforto (28,7%), pela falta de flexibilidade dos serviços (20,7%) e pelo elevado tempo de viagem (20,4%), principalmente. Esses problemas são resolvidos, na opinião dos entrevistados, pelos aplicativos. Dentre outros problemas relatados pelos usuários sobre os ônibus, estão a insegurança, os veículos antigos e o preço da passagem.

Gasto maior com transporte do ‘eu sozinho’

Para ter mais comodidade, os usuários não se incomodam em pagar mais. O custo médio diário para quem pega ônibus (R$ 9,75) é cerca de um terço do custo de quem usa o carro (R$ 29,91) e transporte por aplicativo (R$ 26,77). Para quem usa moto, a média de gasto por dia é de R$ 10,79. Mais de 57% dos entrevistados ainda disseram estar dispostos a pagar uma tarifa mais cara para viajarem somente sentados nos ônibus.

“O comportamento das respostas pode ser explicado pela comodidade e conveniência oferecidos pelo transporte privado por aplicativo, mesmo que isso implique um valor de tarifa mais elevado”, diz a pesquisa.

Queda maior entre as classes C e D/E

O levantamento mostra que a redução dos deslocamentos coletivos foi significativa em todas as classes sociais, mas ainda mais representativa nas classes C e D/E, em que o recuo foi de cerca de 20 pontos percentuais, para 35,6% e 37,9%, respectivamente.

Mesmo assim, cerca de 80% dos deslocamentos de ônibus são realizados por pessoas das classes C e D/E. Segundo o levantamento, esse meio de transporte é o único disponível para 52% dos entrevistados.

A opção pelos aplicativos de transporte também é maior para as faixas de renda mais baixas (68,4%). Por outro lado, quase 57% dos deslocamentos em carro próprio são feitos pelas classes A e B.

Tecnologia e pandemia

Segundo a CNT, a mobilidade da população nas cidades brasileiras foi afetada nos últimos anos pelo desenvolvimento tecnológico e pela pandemia de Covid-19, assim como pela ausência de planejamento em muitas cidades, como manda a Política Nacional de Mobilidade Urbana.

Houve também mudanças no mercado de trabalho, com redução do desemprego, mas aumento do número de autônomos.

A transformação do mercado de trabalho, destaca a confederação, tem relação com novas oportunidades geradas pela tecnologia. Nesse sentido, destaca, entre 2017 e 2024, maior aquisição de veículos, especialmente motos, e o desenvolvimento de plataformas de transporte por aplicativo.

Mais tempo de deslocamento

“Nesse quadro, a crescente posse e o uso de veículos individuais e a falta de priorização do transporte coletivo no sistema viário urbano causam congestionamentos e maior tempo de deslocamento.

A pesquisa identifica que o tempo médio de viagem supera 35 minutos nas grandes cidades. Nas capitais brasileiras, o tempo para percorrer um trajeto de 10 quilômetros em um dia de semana normal chega a ser, em média, 90% maior em momentos de congestionamento ante períodos com trânsito menos intenso. Em Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife, o tempo dobra.

“Iniciada na pandemia, a redução na demanda de passageiros no sistema de transporte coletivo, não terá sua inércia revertida sem mudanças estruturais. Isso contribui bastante para o cenário de precarização do serviço, no qual a forma de se deslocar nas cidades caminha em direção a insustentabilidade.”

Para o presidente da CNT, Vander Costa, a pesquisa ajuda a propor e a trabalhar em prol de soluções que possam fomentar a utilização do transporte público no país.

“Em um ano com eleições municipais, é fundamental que os candidatos coloquem a mobilidade urbana no centro de suas propostas, garantindo investimentos e políticas que tornem o transporte público mais eficiente, seguro e acessível para todos”, disse em nota.

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