A miopia do imóvel compacto

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Já faz alguns anos que acompanho em todo o Brasil o processo de investimentos em produtos para o “short stay”, em português, aluguel de curta duração ou temporada. Algo que virou febre em diferentes regiões do Brasil através dos imóveis compactos, e em João Pessoa, não foi diferente.

O conceito dos imóveis compactos ganhou muita força em São Paulo, quando a Vitacon, uma construtora com uma pegada inovadora, lançou a ideia de que as pessoas podem viver em imóveis de 20m², próximos a estações de metrô e assim driblar o problema de mobilidade que a cidade oferece. Obviamente que um trabalho de marketing e assessoria de imprensa muito bem executado fez com que todos ficassem chocados com a ideia de se viver em um micro apartamento, mas atraiu investidores e o sucesso foi meteórico, um problema real encontrando uma solução real transformou a Vitacon em um dos maiores cases de sucesso dos últimos anos.

A partir daí, outros empreendedores, incorporadores e construtores de diferentes partes do Brasil, perceberam a oportunidade de criar algo e assim suprir uma necessidade do seu mercado local com produtos de menor preço atraindo investidores e compradores do primeiro apartamento. Em alguns casos era uma solução para resolver problemas de rede hoteleira insuficiente ou antiquada, usando para isso tecnologia de plataformas de autogestão do tipo Airbnb. Na Paraíba, em João Pessoa, foi assim. Eu lembro bem como era me hospedar em Jampa antes e depois dos compactos e como isso foi importante para evolução do mercado imobiliário e consequentemente o setor de turismo. A revolução dos compactos gerou riqueza para a cidade, isso é um fato!

No entanto, todo processo de mudança em hábitos de consumo traz oportunidades maravilhosas na zona de inflexão e essas oportunidades tendem a diminuir com o tempo, reduzindo os ganhos e aumentando os riscos. A reflexão que quero trazer aqui passa um pouco por esses pontos.

Uma das perguntas que mais escuto de corretores e donos de construtoras é “Será que o mercado de apartamentos compactos em João Pessoa já não está saturado?”. Uma pergunta simples para uma resposta complexa. Para responder essa pergunta você precisa olhar basicamente para os dados, indicadores de vacância, número de unidades ativas e em construção em oferta, curva de preço médio das diárias, crescimento do turismo, número de leitos hoteleiros, entre muitos outros dados podem te dar uma resposta com maior precisão, mas uma coisa é certa, a curva da zona de inflexão já não é a mesma e com isso, fazer bons negócios exige uma assessoria de um bom corretor de imóveis.

Outra forma direta de responder essa pergunta é olhar através do prisma do investidor. A conta é simples, o valor das diárias e o percentual de ocupação precisam fechar próximos de 1% ao mês em resultado líquido, ou seja, já com os descontos do custo operacional de empresas gestoras, contas de consumo, condomínio e impostos. Vale lembrar que unidades em aluguel de temporada demandam maior manutenção, a alta rotatividade de usuários vai trazer custos de manutenção que impactam diretamente nesse resultado. Em João Pessoa, os valores de diárias atualmente praticados em apartamentos compactos só conseguem entregar esse resultado quando o “cap de locação” é calculado com base no valor de lançamento em tabela inicial, é mais difícil um produto de repasse, vendido depois de pronto conseguir entregar esse resultado. O ponto negativo para esse contexto é que isso trava o crescimento do preço de metro quadrado para novas construções e reduz as margens, já que os custos de construção continuam crescendo. Essa talvez seja a grande resposta para aquela pergunta “Já saturou?”. Do ponto de vista de potencial que a cidade oferece “não”, mas do ponto de vista de momento e resultado, talvez “sim”.

O mercado imobiliário vive de ciclos e é importante ter essa leitura. Talvez seja a hora de reduzir a oferta de um tipo de produto para equilibrar o mercado, gerar uma nova demanda reprimida que permita crescer novamente, mas para isso é preciso maturidade estratégica do setor.

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Guilherme Carnicelli
Guilherme Carnicelli é consultor de empresas, atuando no setor imobiliário com projetos no Brasil e nos Estados Unidos. Publicitário com MBA em Gestão Empresarial Estratégica, foi fundador do Café Imobiliário, empresa que durante uma década foi referência em conteúdo para o setor imobiliário no Brasil. Como consultor atuou em projetos grandes empresas como RE/MAX, Coldwell Banker, Goldman Sachs e JP Morgan. É o criador do projeto Miami Xperience que faz conexão entre o mercado imobiliário brasileiro com os Estados Unidos em mais de dez edições, mas acima de tudo um apaixonado por João Pessoa.